QUAL É O IMPACTO DA WEB 2.0 NO WEBJORNALISMO?

 

Milton Cappelletti Júnior

Lafayette B. Melo

Centro Federal de Educação Tecnológica da Paraíba

e-mail: miltoncappelletti@gmail.com

e-mail: lafam@uol.com.br

 

 

Resumo

 

A Internet é uma tecnologia dinâmica, com grande capacidade de assimilar novas tecnologias em suas práticas. Atualmente, observamos que alguns dos seus principais conceitos e tecnologias evoluíram ou mudaram de foco, conforme pode ser percebido em outras áreas de conhecimento, as quais utilizam a Internet como meio de transmissão de informações, como é o caso do Jornalismo. Desta forma, este trabalho visa a discutir o que é a Web 2.0 e estabelecer a sua influência no âmbito do Webjornalismo, através de uma análise crítica das principais bibliografias dirigidas ao assunto, a fim de que possamos obter maior conhecimento a respeito deste objeto de estudo.

 

Palavras-chave: Web 2.0. Webjornalismo. Comunicação Social.

 

 

1. Introdução

 

            Desde o seu surgimento, a Internet passou por diversas mudanças. De uma tecnologia desenvolvida para fins militares, passou a ser utilizada pelos cientistas e, posteriormente, pelas universidades, com objetivos educacionais. Atualmente, a Internet já faz parte do cotidiano das pessoas em suas mais diversas atividades, sendo inclusive considerada o maior sistema de comunicação desenvolvido pelo homem (Dal Molin, 2004).

            Por se adaptar facilmente a outras novidades tecnológicas nela inseridas, a Internet apresenta um caráter dinâmico e as mudanças ocorridas na construção de páginas Web afetam o seu conteúdo e a forma como ela é utilizada pelas pessoas.

            Recentemente, percebe-se neste meio uma tendência na qual o usuário está produzindo o conteúdo que consome e interagindo mais com outros usuários, graças à um aparato tecnológico, que envolve Wiki, Ajax, RSS, etc, e à novos conceitos, como a folksonomia e as aplicações na Web. Este nova “onda” da Internet, chamada de Web 2.0, tem efeitos em diversas áreas que a utilizam como meio, como é o caso do Webjornalismo.

            Desde o seu surgimento, o Webjornalismo tem reproduzido na Internet a mesma lógica de produção do jornalismo impresso, desconsiderando as potencialidades oferecidas por esta tecnologia. O novo paradigma oferecido pela Web 2.0 vem a mudar esta dinâmica, como pode ser evidenciado, por exemplo, através do Jornalismo Colaborativo, do novo papel dos Weblogs para o usuário, na nova forma como classificamos um conteúdo, entre outros.

            Desta forma, este trabalho tem como objetivo identificar que impactos a Web 2.0 proporcionou ao Webjornalismo, em relação a sua produção e ao modo como o público se relaciona com estas informações. Também será discutido o uso de novas tecnologias na Internet e o papel delas nesta mudança com a qual o público se encontra diante.

            A metodologia adotada consiste numa pesquisa bibliográfica, de base exploratória, através da análise crítica de outros artigos, teses, ensaios e livros escritos pelos mais diversos autores sobre o assunto. Através da tabulação dos dados colhidos, analisarei o problema apresentado.

 

 

2. Entendendo a Web 2.0

 

2.1 Conceituação

           

            O termo Web 2.0 refere-se à segunda geração da World Wide Web - tendência que reforça o conceito de troca de informações e colaboração dos internautas com sites e serviços virtuais. A idéia é que o ambiente on-line se torne mais dinâmico e que os usuários colaborem para a organização de conteúdo.

            A origem do termo remonta à 2004, quando representantes da editora O'Reilly e da promotora de eventos MediaLive realizaram uma sessão de “brainstorming” para conceber um congresso sobre Internet. Dale Dougherty, vice-presidente da O'Reilly, percebeu que mais do que nunca, a Internet se tornara mais importante para as pessoas e empresas, devido às novas aplicações e sites que estavam obtendo grande sucesso continuamente, como se uma nova fase houvesse surgido após o estouro da bolha da Internet no final da década de 90. Desta forma, batizou-se o momento de Web 2.0 e este foi o nome da primeira conferência, realizada em outubro daquele ano na cidade de São Francisco[1].

            Como muitos outros conceitos relacionados à Internet, o termo Web 2.0 não tem um limite teórico ou um conceito fechado. Desta forma, podemos pensar nele como um conjunto de princípios e práticas que aproximam diferentes sites e aplicações em torno dos mesmos objetivos.

            A definição mais utilizada é a de O'Reilly (2006):

 

Web 2.0 is the business revolution in the computer industry caused by the move to the internet as platform, and an attempt to understand the rules for success on that new platform. Chief among those rules is this: Build applications that harness network effects to get better the more people use them[2].

 

            A Web 2.0 oferece maior flexibilidade e interatividade. A idéia é refletir as aplicações desktop na Web e fazer com que cada vez mais pessoas a usem. Um dos principais benefícios que a Web 2.0 traz para um sistema é que conseguimos juntar em um só lugar a facilidade de utilizar a internet e a velocidade de atualização que ela permite com a usabilidade de um sistema desktop.

            Muitos consideram toda a divulgação em torno da Web 2.0 um golpe de marketing. Como o universo digital sempre apresentou interatividade, o reforço desta característica seria um movimento natural e, por isso, não daria à tendência o título de "a segunda geração". Polêmicas à parte, o número de sites e serviços que exploram esta tendência vem crescendo e ganhando cada vez mais adeptos.

 

2.2 Principais Características

 

            De acordo com O’Reilly, o núcleo de todo o conceito da Web 2.0 é aproveitar a inteligência coletiva. A regra mais importante para fazer sucesso na internet é aproveitar o fato de existir tanta gente acessando um serviço e a facilidade de poder colher contribuições dos usuários, agregando valor ao serviço. Essa contribuição pode vir em forma de votos, que definem qual conteúdo é melhor; pode ser o próprio conteúdo do serviço, como acontece nos sites colaborativos; ou pode ser na organização do conteúdo, com palavras-chave (tags).

            Desta forma, percebe-se que o coletivo começa a predominar sobre o individual. O imediatismo cede espaço a resultados de médio e longo prazo. Figuras jurídicas e comerciais como direito autoral são substituídos por conceitos como autoria compartilhada e recombinação de idéias. A certificação de credibilidade por instituições e personalidades passa a ser feita por sistemas eletrônicos baseados em cálculos de probabilidade, cujas informações são fornecidas pelos usuários. A gratuidade deixou de ser associada à filantropia para ser um direito assumido pelos internautas. É aí que está a inteligência coletiva.

            Nos primórdios da Web 1.0, esse processo de construção de informações e conhecimentos pelos usuários ocorria unicamente pela soma de contribuições individuais dispersas em sites, listas e grupos de discussão, cabendo ao usuário a tarefa de buscar e agregar a partir desse manancial disponível. Na Web 2.0, passamos a dispor de plataformas e ferramentas que produzem uma agregação automática das contribuições individuais, incrementando o potencial de uso dessa inteligência coletiva.

            Assim, podemos concluir que se usuários produzem e consomem conteúdo entre si numa verdadeira comunidade, quanto mais usuários um site ou sistema têm, há mais conteúdo a ser produzido, alterado ou validado. Com isso, a qualidade do serviço aumenta, pois ele não é mais desenvolvido como um produto. Este fato remete a importância do usuário neste novo modelo de negócios, num reflexo das prática de desenvolvimento em código aberto. A chave para a vantagem competitiva nas aplicações de internet está no fato de que os usuários são donos das informações que fornecem.

            Outro importante elemento da Web 2.0 é a democratização da informação. Agora, cada cliente é também um servidor e os arquivos são quebrados em partes que podem ser acessados em diferentes locais. Todos os usuários podem ser emissores e receptores no processo de troca de dados. O fluxo das informações deixou de ser unidirecional e passou a ser multilateral - descentralizado.

            O grande espaço de colaboração proposto pela Web 2.0 deu vazão a discussão sobre os direitos reservados do conteúdo oferecido. Proteção de propriedade intelectual pode limitar a reutilização e impedir a experimentação. Portanto, dificilmente pensaríamos na Web 2.0 caso houvesse a restrição privada de conteúdo e informações. Apesar disso, ainda existem padrões e licenças que são utilizados de acordo com o modelo de negócios do sistema.

            Anderson (2006) descreveu um outro importante fenômeno da Web 2.0. De acordo com as suas observações, a cultura e a economia estão rapidamente mudando seu foco - de um relativamente pequeno número de hits (produtos que vendem muito no grande mercado) para um grande número de produtos de nicho. São os sites pequenos que formam a grande massa da Internet, ao contrário do que se pensava. Sites direcionados a públicos menores tendem a fazer maior sucessor do que grandes portais de comunicação. Isto pode ser descrito matematicamente através de um gráfico que lembra uma “cauda longa” (long tail), conceito utilizado para descrever este fenômeno.

            Os sites e sistemas que seguem os preceitos da Web 2.0 tendem a apresentar um contínuo processo de desenvolvimento. Mesmo antes de terminados, eles são disponibilizados na Internet para que sejam utilizados e testados pelos usuários de modo que qualquer falha seja corrigida ou novo recurso utilizado em tempo real. É o que se chama de beta perpétuo.

            Percebe-se, desta forma, que o avanço das idéias de compartilhamento, recombinação e código aberto inevitavelmente mexeu em valores tradicionais e bem arraigados da cultura da internet.

 

2.3 Tecnologias envolvidas

 

            Para que a Web 2.0 pudesse ser implementada, novas tecnologias foram utilizadas para dar sustentação aos seus princípios básicos. Algumas delas são apenas melhorias em relação a tecnologias já existentes, enquanto outras representam uma nova perspectiva na forma como se utiliza a Internet.

            Um das novas linguagens de programação que ganhou destaque na Web 2.0 foi o Ajax. Constituído por um conjunto de tecnologias que servem para criar aplicações ricas para Internet, o Ajax é responsável por transformar a Internet numa plataforma parecida com o desktop.

            Apesar de o termo AJAX ter sido usado pela primeira vez em 2005, as tecnologias que englobam o termo tiveram início ainda no final da década de 90, nos navegadores de geração “4” (Internet Explorer 4.0 e Netscape Navigator 4.0), que introduziram suporte a técnicas de remote-scripting – tecnologia que permite executar rotinas de programação em um browser para trocar informações com um servidor.

            Com o lançamento da versão 5.0 do Internet Explorer em 2000 e a estagnação do Netscape Navigator (que mais tarde teve seu código fonte disponibilizado pelo público gerando o Firefox), a Microsoft inaugurou uma forma mais eficiente de remote-scripting com o XMLHttpRequest. Daí até os dias atuais o conceito só evoluiu, ganhando força e notoriedade devido ao aumento no número de usuários da rede. Ele é baseado em XHTML e CSS para conteúdo e apresentação, DOM (Document Object Model) para apresentação dinâmica e interação, XMLHttpRequest para recuperação assíncrona de dados e XML e Javascript para unir tudo.[3]

            Outra tecnologia envolvida é o RSS. Abreviação de "really simple syndication" (distribuição realmente simples, agregador de notícias), esta é uma maneira de distribuir informação por meio da internet que se tornou uma poderosa combinação de tecnologias "pull" - com as quais o usuário da web solicita as informações que deseja-- e tecnologias "push" - com as quais informações são enviadas a um usuário automaticamente. O visitante de um site que funcione com RSS pode solicitar que as atualizações lhe sejam enviadas (processo conhecido como "assinando um feed"). Para isso, o usuário escolhe os sites, os cadastra num agregador de notícia e acessa os textos de todos os sites em um mesmo lugar, ao invés de precisar conferir site por site se há alguam novidade.

            RSS representa um avanço significativo na arquitetura da Internet. Desde que foi adotada em suas interfaces, foi responsável pelo seu crescimento e popularização dos Weblogs. Isto acontece devido à forma como um site pode se comunicar como o outro, visto que os agregadores de conteúdo direcionam um link não só com a uma única página Web, mas com o conteúdo de diversas páginas. Desta forma, os blogs passaram a se comunicar e formar vínculos mais fortes do que a simples inclusão de um link para outro site.

            Thomas Vander Wall criou a palavra “folksonomia” quando uniu as palavras inglesas folks (determina pessoas) e “taxonomia” (a ciência de classificar) e assim formalizou o conceito de classificar páginas Web, imagens, Weblinks e outros conteúdos da Internet através de rótulos chamados tags. As tags são criadas pelos usuários através de palavras-chaves que descrevam da melhor forma aquele conteúdo na sua perspectiva. Os usuários da folksonomia costumam descobrir tags de outros usuários que tendem a classificar e interpretar conteúdos de uma forma que faça sentido para eles. O resultado é um imediato ganho na eficiência do usuário em encontrar conteúdos específicos, contrário à classificações estanques pré-determinadas pelos sites de busca e servidores.

            Na folksonomia, há três elementos importantes: a pesquisa - refere-se às relações entre informação e classificação entre links e suas tags; tags - palavra que reflete a classificação de um conteúdo, após uma análise de uma informação e estabelecimento de uma relação com outras palavras que façam sentido ao contexto descrito; e usuário – pessoa que fornece a informação e estabelece a organização para ela, constituindo a parta “pensante” do processo.

             Os sistemas de tags formam também uma rede social de informações, na qual é feita a busca pelos usuários, através das relações formadas entre a informação em si e suas tags relacionadas. O efeito colaborativo de muitos milhares de usuários é um dos pontos centrais de sites que trabalham com sob a orientação da Web 2.0. Agora são as pessoas que “etiquetam” o conteúdo, diferente da taxonomia, onde elas precisavam se encaixar em classificações. Assim, surge uma grande novidade: não é o usuário que se adapta a Web, mas a Web que se adapta ao usuário (Rodrigo, 2005).

            Outra contribuição da coletividade à Internet são as Wikis, páginas comunitárias que podem ser alteradas por todos os usuários que têm direitos de acesso. Usadas na Internet pública, essas páginas comunitárias geraram fenômenos como a Wikipedia, que é uma enciclopédia on-line escrita por leitores. Usadas em empresas, as wikis estão se tornando uma maneira fácil de trocar idéias para um grupo de trabalhadores envolvido em um projeto.

            Outra forte tendência são as aplicações Web, termo usado para designar, de forma geral, sistemas de informática projetados para utilização através de um navegador, na Internet ou em redes privadas. Elas utilizam uma arquitetura multinivel onde as funções executadas pelas aplicações podem estar distribuídas por uma rede de computadores. O desenvolvimento de Aplicações Web está relacionado, entre outros fatores, à necessidade de simplificar a atualização e manutenção mantendo o código-fonte em um mesmo local, de onde ele é acessado pelos diferentes usuários.

            As aplicações Web estão se tornando cada vez mais interativas. Isto porque elas estão se comunicando e combinando conteúdo de mais de uma fonte em uma experiência integrada. A este processo chamamos de mashup, que, na verdade, são agregações de diversas funcionalidades obtidas de diferentes websites para criar uma experiência diferenciada para o usuário.

            De acordo com Taurion (2007) uma aplicação mashup contém três componentes básicos: um site provedor de conteúdo, que geralmente expõem  parte ou todo de seu conteúdo através de APIs, que utilizam interfaces como Web Services; o site mashup, que hospeda a aplicação mashup; e o navegador (browse) na máquina do usuário, através das técnicas de programação baseadas em JavaScript ou Applets.

 

 

3. Breve histórico do Webjornalismo

 

            Antes da invenção do World Wide Web, a rede já era utilizada para a divulgação de informações jornalísticas, apesar dos serviços oferecidos serem direcionados para públicos muito específicos e funcionassem através da distribuição de e-mails, de boletins em sistemas compartilhados ou de recursos semelhantes. A Internet passa a ser utilizada para atender finalidades jornalísticas de forma mais expressiva a partir de sua utilização comercial, que se dá com o desenvolvimento da Web no início dos anos 90.

            Marshall Mcluhan afirmava que o conteúdo de qualquer médium é sempre o antigo médium que foi substituído. A internet não foi exceção. Devido a questões técnicas (baixa velocidade na rede e interfaces textuais), a Internet começou por distribuir os conteúdos do meio substituído – o jornal. Contudo, como Salomon apud Canavilhas (2001) afirmou “cada meio fomenta o desenvolvimento de capacidades específicas, mas estas só se adaptam ao próprio meio”.

            De acordo com Palacios (2002), é possível identificar três fases distintas na história do Webjornalismo. Num primeiro momento, chamado pelo autor de transposição, as notícias eram a reprodução de uma ou mais matérias de algumas editorias do jornal impresso. Copiava-se para a Web o conteúdo dos jornais sem quaisquer alterações.

            Com o aperfeiçoamento e desenvolvimento da estrutura da Internet, o autor identificou uma segunda fase chamada de metáfora, na qual o jornal impresso é utilizado como metáfora para a elaboração das interfaces dos produtos. As publicações na Web começaram aproveitar as inovações da rede como: links - utilizados como chamadas para notícias de fatos que acontecem no período entre as edições; email - comunicação de jornalista com o leitor ou entre os leitores; utilização dos recursos do hipertexto; e surgimento da seção últimas notícias nos principais jornais do mundo.

            O cenário começou a modificar-se a partir de iniciativas empresariais ou individuais focadas na produção de notícia somente para Web ou tecnologias móveis. Esta é a terceira fase do Webjornalismo, marcada pelos recursos multimídias (texto, imagem, som, vídeo), recursos de interatividade (chats com participação de personalidades públicas, enquetes, fóruns) e customização das notícias (sites criam ambientes de conteúdo a partir do interesse do usuário).

            A partir deste quadro, diversos autores identificaram características comuns ao Webjornalismo, que a diferenciavam dos outros meios de comunicação de massa.

            Para Bardoel e Deuze (2000) existem quatro pontos marcantes. A multimidialidade, a qual se refere à convergência dos formatos das mídias tradicionais (texto, imagem e som) na narração do fato jornalístico; interatividade, através da qual o leitor/usuário se sente mais diretamente parte do processo jornalístico a partir da navegabilidade e de emails, chats e enquetes; hipertextualidade, que possibilita a interconexão de textos através de links e engloba a hipermídia (link em conteúdo multimídia) e hipertexto (link em conteúdo .txt); e customização do conteúdo, que consiste na individualização ou personalização da notícia.

            Num estudo posterior, Palacios (2005) apontou outras três características do Webjornalismo, complementares às anteriores. A primeira delas é a memória, a qual é mais viável técnica e economicamente na Web do que em outras mídias, pois a acumulação de informações é coletiva e entre páginas internas e externas. Já a instantaneidade ou atualização possibilita o acompanhamento contínuo em torno do desenvolvimento dos assuntos jornalísticos de maior interesse. Por fim, o comunitarismo permite ao jornal se tornar uma rede social, sendo produzido coletivamente.  Trata-se de o jornal adotar o conjunto de publicações de usuários como parte da sua interface gráfica e do conteúdo editorial.

            Percebe-se que o Webjornalismo aperfeiçoou-se a partir do desenvolvimento de novas tecnologias na Internet e da criação de um novo modelo de negócio pelas empresas jornalísticas, as quais começaram a pensar na Internet como uma possibilidade real para a transmissão de notícias e manutenção de seu status quo de centralizadora de informações.

 

 

4. Impactos da Web 2.0 no Jornalismo

 

            Para a maioria dos repórteres que trabalham em redações jornalísticas, a Internet não passa de uma ferramenta para mandar emails e para fazer buscas. Mas os profissionais que atuam em sites de jornalismo online estão descobrindo que a rede é muito mais do que isto e estão sendo obrigados a agir de forma não convencional.

            Quem faz jornalismo na Web começa a descobrir as vantagens de compartilhar com outras pessoas o seu projeto de investigação ou de reportagem, visando com isto recolher sugestões, contribuições e dicas. É a aplicação ao jornalismo dos princípios da Web 2.0, onde o valor de uma informação é dado pela intensidade da recombinação de sugestões oferecidas por leitores ou usuários.

            Ferramentas como as páginas Web, blogs, listas de discussão, fóruns, chats e correio eletrônico deram ao público um poder inédito em matéria de observação crítica da imprensa e isso passou a ameaçar o olímpico isolamento dos jornalistas e formadores de opinião pública. Os profissionais que já estavam perdidos pelo encolhimento das redações, pela introdução maciça de novas tecnologias, pela falta de tempo e recursos para contextualizar informações, passaram também a enfrentar leitores vigilantes e cheios de exigências. Por outro lado, os leitores e os autodenominados jornalistas amadores passaram a exercer o seu papel ativo na comunicação sem terem tomado consciência de toda a complexidade do jogo da informação.

            Assim, percebemos uma primeira mudança no jornalismo: uma atividade profissional que sempre valorizou o individualismo e o sigilo passa agora a depender da transparência e do coletivo para se desenvolver. Trata-se de uma mudança de valores e comportamentos bastante radical na vida dos jornalistas.

            O desembarque das tecnologias chamadas sociais no mundo do jornalismo online provocou alterações na composição da agenda de interesses do público. Até agora os jornais e a televisão determinavam sozinhos os assuntos que as pessoas iriam discutir. Agora há um novo parâmetro de preferências, desta vez alimentado diretamente pelo voto dos consumidores de informação.

            Outra mudança ocorreu no processo de elaboração do material noticioso, onde a publicação não é mais o ponto final do processo informativo, mas sim a parte que deverá ser completada pelo usuário. Gillmor (2006) destaca que “com as novas tecnologias, como a internet e o celular, a mídia se democratizou. Não no sentido de maiores direitos das pessoas, mas de maior participação de todos na comunicação”.

            O que antes era valorizado pela sociedade analógica como a informação e notícia, passa a ser matéria prima gratuita na Web 2.0, onde o valor agregado é criado pela contribuição de milhões de anônimos. Em poucas palavras, pode-se dizer que os jornalistas não dependem mais de um veículo para divulgar as notícias. Na verdade, ninguém mais precisa de um veículo. Todos podem se tornar produtores e distribuidores de informação na Internet. A abundância de agências de notícias, sites informativos e facilidades de acesso às fontes vêm afetando a alma do jornalismo. Todos agora são “jornalistas”. Isto está transformando as relações entre jornalista-leitor de forma que os jornalistas estão tendo dificuldades em formar um discurso consensuado sobre o mundo, porque a multiplicidade de fontes escapa a sua agenda de interesses.

            O texto webjornalístico também está em processo de mudança. O distanciamento crítico e objetividade pregados pelos manuais de jornalismo através da técnica da pirâmide invertida devem desaparecer e ceder espaço à interpretação. O jornalismo informativo está se apropriando do comentário e da opinião, típicos de outros formatos jornalísticos impressos, criando uma grande necessidade de credibilidade. Com excesso de fontes, sobreviverão apenas aqueles que transmitem confiança com o público. A velocidade será fundamental, mas ela somente terá validade com credibilidade e correção. Não adiantará dar a informação antes, se ela estiver errada. O enfoque diferenciado para as informações será o caminho para o jornalismo na era da Web 2.0.

            Palacios (2005) aponta o início de uma quarta fase na historia do WebJornalismo. Nela há predominância de duas correntes principais: o Flash Journalism e o Jornalismo Participativo. No primeiro, as notícias são apresentadas a partir da linguagem Flash. Há um peso menor para o texto e maior para o multimídia. É utilizado, sobretudo, para a produção de especiais. É nesta etapa que a emergência da tecnologia RSS põe fim a navegabilidade entre páginas de notícia, convergindo todas elas a apenas um aplicativo.

            A outra corrente é o chamado Jornalismo Cidadão, ou Jornalismo Participativo ou ainda Jornalismo Colaborativo. Trata-se da idéia de que o conteúdo jornalístico difundido pela Internet (texto, imagens, infográficos, vídeos, etc) possa ser produzido por qualquer pessoa, independente de ser jornalista ou não. O Jornalismo Colaborativo ganhou força nos últimos anos a partir do advento das ferramentas de edição e publicação na internet como wikis, blogs e a popularização dos celulares equipados com câmeras digitais – frutos da Web 2.0.

            No relatório We Media: How Audiences are Shaping the Future of News and Information (Nós-Mídia: como o público está moldando o futuro do jornalismo e da informação), os pesquisadores Shayne Bowman e Chris Willis definem o Jornalismo Colaborativo como um ato de cidadãos "fazendo um papel ativo no processo de coleta, reportagem, análise e distribuição de notícias e informações". Eles ainda acrescentaram que "a intenção desta participação é fornecer informação independente, confiável, precisa, abrangente e relevante que a democracia requer".[4]

            Num artigo publicado em 2003 pela Online Journalism Review, J. D. Lasica classifica a mídia do Jornalismo Colaborativo em seis tipos: participação do público (tais como comentários no rodapé das matérias, blogs de colunistas que aceitam comentários, uso de fotos e filmagens feitas por leitores, ou matérias escritas localmente por moradores de comunidades); websites jornalísticos independentes; websites de notícias totalmente alimentados por usuários; websites de mídia colaborativa e contribuitiva; websites de transmissão pessoal (podcasting de áudio e vídeo, blogs, fotologs); e outros tipos de "mídia magra" (listas de discussão, boletins por correio eletrônico).

            O protagonismo do cidadão comum surge em conseqüência do poder que ele conquistou na Internet porque no mundo físico, ele está cada dia mais marginalizado pelas instituições e pelos políticos. Assim, o Jornalismo Colaborativo se caracteriza pela maior liberdade na produção e veiculação de notícias, já que não exige formação específica em jornalismo para os indivíduos que a executam, mas, por outro lado, assim como outros sistemas colaborativos (como o wiki), carece de precisão e controle de qualidade sobre o conteúdo publicado.

            Para os adeptos e ativistas desta prática, o Jornalismo Colaborativo é uma chance de democratizar a informação, a partir do momento em que qualquer pessoa teria acesso à mídia, não apenas como leitor ou espectador, mas colaborando na produção do material veiculado. Também seria, para os defensores do New Journalism, uma oportunidade para valorizar a reportagem, incluindo a observação de testemunhas oculares dos fatos.

            Outro aspecto a ser analisado é a utilização em grande escala dos Weblogs. Além de aproximar os jornalistas de seus leitores e prováveis colaboradores, estas páginas atribuem ao editor o papel de dialogar com o público a fim de encontrar uma pauta comum às duas partes interessadas. A maioria dos grandes jornais tratou de “profissionalizar” o meio, disponibilizando espaços para articulistas de suas equipes editoriais. Departamentos de mídia de agências também investem no potencial desse canal e vêm adaptando formatos e ações a essa realidade.

            Os Weblogs funcionam como revistas eletrônicas ao prover aos leitores notícias, dicas e comentários sobre um determinado assunto. Comentários pessoais são evitados, embora algumas vezes apareçam. Geralmente possuem um tema central, como, por exemplo, cultura pop, tecnologia ou mesmo design gráfico. Esses blogs procuram trazer links, comentar notícias e mesmo fazer críticas a outras publicações. Além disso, podem realizar um clipping de informações relativas ao assunto-escopo e publicá-las. O objetivo permanece claro em todos os casos: informar. São estes Weblogs que eram tidos, até então, como rivais ao jornalismo pela sua característica de "filtro" da informação na Internet. (Hiller, 2002, online; Brocanelli, 2002, online; Outing, 2002, online, entre outros).

            Apesar dos weblogs existirem antes da Web 2.0 - e talvez tenham sido o primeiro registro do que seria mais tarde chamado de Jornalismo Colaborativo-, nunca estas publicações eletrônicas haviam sido utilizadas extensivamente como meio de informações jornalísticas. Além do advento do RSS, um dos motivos responsáveis por esta nova tendência é o Webring.

            O termo Webring é utilizado para definir círculos de bloggeiros que lêem seus blogs mutuamente e interagem nestes blogs através de ferramentas de comentários. Os blogs são linkados uns nos outros e formam um anel de interação diária, através da leitura e do comentário dos posts entre os vários indivíduos, que chegam a responder aos comentários uns dos outros ou mesmo deixar recados para terceiros nos blogs. Recuero (2004) afirma que esse círculo de blogs difere, basicamente, de um grupo de links porque o blog funciona como uma representação do bloggeiro no ciberespaço. Portanto, num webring, temos um grupo de pessoas, mais do que um grupo de links.

            Outro ponto que justifica o sucesso dos Weblogs a partir da Web 2.0 é a participação do usuário comum através de comentários. Os comentários deixados nos Weblogs são fundamentais porque proporcionam dinamismo ao site, e mais, proporcionam aos leitores interagir com o autor, construir um diálogo com o autor e também com os demais leitores.

            Essa perspectiva dialógica, de construção da comunicação entre os dois pólos comunicativos, é a chamada interação mútua, proposta por Primo apud Recuero (2003, online), em oposição à interação reativa, simplesmente uma ação e reação, geralmente observada na interação entre indivíduo e máquina. Utilizamos a noção de interação mútua como aquela que o suporte deve proporcionar para que os indivíduos possam construir relações sociais formadores de uma comunidade virtual. Para que este interação seja possível, é essencial o uso da ferramenta de comentários nos Weblogs, emergentes da Web 2.0.

 

 

5. Considerações finais

 

            Mais do que um conjunto de novas tecnologias, a Web 2.0 é um conceito que ganhou atenção pela remodelagem do intuito da Web, a qual deixou de ser uma simples ferramenta e se torna uma plataforma. Para que isto pudesse ocorrer, foi necessário repensar antigas tecnologias e desenvolver novos paradigmas para que a colaboração e a interação, propostos pela Web 2.0, fossem implementadas.

            Este novo modo de pensar a Internet   afetou outras áreas de conhecimento, como o Webjornalismo, que até então apenas a utilizava como meio para reproduzir o modus operandi dos jornais impressos. A partir da Web 2.0, a abundância de agências de notícias, sites "informativos" e facilidades de acesso às fontes alteraram o comportamento dos jornalistas e dos produtores de notícia ao facilitar o seu trabalho e introduzir uma nova dinâmica com o público.

            Contudo, assim como as novas tecnologias ampliaram a capacidade de pesquisa e produção informativa no Webjornalismo, elas também banalizaram a atividade de reportagem e pesquisa. Com a Internet, a prática de entrar na rede e retirar informações para fazer uma matéria tornou-se trivial e cada vez mais realizada por não-profissionais, o que provocou o chamado Jornalismo Colaborativo e o “ressurgimento” dos Weblogs. Todos podem se tornar produtores e distribuidores de informação na Internet.

            Assim, podemos perceber através da Web 2.0 que o Webjornalismo está passando por um período de mudanças, que implicam na sua adaptação à uma nova realidade na qual a Internet se encontra.

 

 

6. Referências Bibliográficas

 

CANAVILHAS, João Messias. Considerações gerais sobre jornalismo na Web. Universidade da Beira Interior, 2001. Disponível em: <http://www.bocc.ubi.pt/pag/_texto.php3?html2=canavilhas-joao-webjornal.html>. Acesso em: 29 abr. 2007.

 

PALACIOS, Marcos. Um mapeamento de características e tendências no jornalismo online brasileiro. Universidade Federal da Bahia, 2002.

 

PALACIOS, Marcos. MACHADO, Elias. Modelos de Jornalismo Digital. Salvador: Salamandra, 2005.

 

RECUERO, Raquel da Cunha. O Interdiscurso Construtivo como Característica fundamental dos Webrings. Intexto, Porto Alegre, v. 10, 2004.

 

RECUERO, Raquel da Cunha. Weblogs, Webrings e comunidades virtuais. Revista da Famecos, v1, n. 31, 2003.

 

Web 2.0 muda rotinas da reportagem online. Apresenta argumentos que justificam a mudança de postura dos jornalistas diante da Internet. Disponível em < http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/blogs.asp? id_blog=2&id=7B0ABAFD-868D-4ADB-913D-881FF34296F9> Acesso em: 29 abr. 2007.

 

Tags e folksonomia: o usuário classifica a informação. Apresenta algumas informações sobre a classificação da informação na Internet. Disponível em <http://webinsider.uol.com.br/index.php/2007/01/12/tags-e-folksonomia-as-pessoas-organizam-a-informacao/> . Acesso em 29 abr. 2007.

 

Web 2.0 por Paul Graham. Análise das principais características da Web 2.0. Disponível em <http://www.paulgraham.com/web20.html >. Acesso em 29 abr. 2007.

 

O desafio do Jornalismo na Web 2.0. Apresenta um panorama geral sobre as novas características do Webjornalismo no contexto da Web 2.0. Disponível em < http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=278DAC001> . Acesso em 29 abr. 2007.

 

Web 2.0: Narciso acha feio o que não é espelho? Apresenta argumentos que justificam o impacto da Web 2.0. Disponível em: < http://gjol.blogspot.com/2006/12/web-20-narciso-acha-feio-o-que-no.html> . Acesso em 29 abr. 2007.

 

Ninguém mais pode ignorar a força dos blogs. Apresenta justificativas sobre o poder dos blogs para o jornalismo e para o modo como lidamos com as informações. Disponível em <http://webinsider.uol.com.br/index.php/2006/10/22/ninguem-mais-pode-ignorar-a-forca-dos-blogs/> . Acesso em 29 abr. 2007.

Web 2.0: Faça você mesmo. Identifica os principais componentes da Web 2.0. Diponível em: <http://www.imasters.com.br/artigo/3640/webstandards/web_20_faca_voce_tambem//imprimir/>. Acesso em 29 abr. 2007.

 

O que é Web 2.0: modelos de design e de negócios para a próxima geração de softwares. Apresenta as principais características da Web 2.0 e faz um comparativo com a Internet 1.0. Disponível em <http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/tim/news/2005/09/30/what-is-web-20.html?page=1>. Acesso em 29 abr. 2007.

 

A Internet, a segurança e a privacidade do consumidor. Discute as origens da Internet e a sua relação com o usuário. Disponível em <http://www.rnp.br/noticias/imprensa/2004/not-imp-040119.html>. Acesso em 29 abr. 2007.

 

A Web 2.0 é uma revolução? Então me deixem criticar. Aponta algumas falhas conceituais e críticas quanto ao conceit ode Web 2.0. Disponível em <http://phpnuke.org.br/index.php?op=NEArticle&sid=2092>. Acesso em 29 abr. 2007.

 

Entenda a Web 2.0. Apresenta os princípios e a história da Web 2.0. Disponível em <http://wnews.uol.com.br/site/noticias/materia_especial.php?id_secao=17&id_conteudo=352&id_coluna=2>. Acesso em 29 abr. 2007.



[1] http://wnews.uol.com.br/site/noticias/materia_especial.php?id_secao=17&id_conteudo=352&id_coluna=2

[2] “A Web 2.0 é uma revolução na indústria da computação causada pela mudança da Internet para plataforma, e uma tentativa de entender as regras para o sucesso nesta nova plataforma. Impera entre estas regras a seguinte: construa aplicações que aproveitem os efeitos da rede para melhorá-las quanto mais as pessoas as utilizem”.

[3] http://phpnuke.org.br/index.php?op=NEArticle&sid=2092

[4] http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornalismo_cidad%C3%A3o#_note-wemedia